- guia de um ordinário vernáculo -


quarta-feira, 31 de outubro de 2012

PASSAGEM NO LITORAL



PASSAGEM NO LITORAL

céu tingido
surdo farol dos poetas
no vento da Barra.

os loucos que correm cheirando a mar
os que correm querendo suar
o cristo penumbra, silhueta
contrastada: escuridão e a salvação
de sóis laranjas.

piso azul de divindades raras
na lua cheia quem já não quis
ver a sereia, a cantadeira?
iemanjá mareia.

brisa beijo nos corpos rebolantes
das calçadas e das areias.

invade o cheio com sotaque das
três vênus gordas que dominam
o caminho de antigos barulhos
pés e arquejos: ajayô.

fátima abençoa de sua casa
de vidro os que caminham
na oceânica avenida até os
rios da boemia, dos bares
e das festas que rodeiam
a diva noturna dos acarajés
e dos que sem paciência entornam
o vinho de jorge.

aqui correm rios de cheiro de
dois de fevereiro e das missas
dominicais

e a continência ao general
é feita enquanto a viagem
prossegue em paz.

salvador me desliza atravancada
e eu sonho com a beleza na calçada
vejo a vida e as gentes
voltando às suas casas.

na lírica luz da lua cheia
louca vontade da sereia
em teus caminhos de calor
meu amor
meu passeio
não tem fim.

sábado, 27 de outubro de 2012

EU SÓ QUERIA DAR UMA VOLTA POR AÍ

EU SÓ QUERIA DAR UMA VOLTA POR AÍ


quem vai se importar com o nada
que insiste em ser sentido
em olho louco, absurdo, canções cantadas
em ouvidos surdos, meu amor.

quem vai saber o que eu sinto
lá na frente, quando isso tudo estiver
vento e eu também: vento.

quem vai se lembrar dos choques
dos olhos do desejo das mãos
dos meus beijos e dos meus ciúmes
por cada coisa doida, por gente outra
hein, meu amor, quem vai lembrar?

quem lembrar do que eu ainda não fiz
mas que um dia eu vou fazer
e do que eu fiz e continuo fazendo
e tudo aquilo que ninguém sabe que eu fiz
nem saberá, hein, quem saberá?

quem vai se importar com o nada
que é sentido mas não é dito e
justamente por isso

 fica preso
                                   no limbo?

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

CANÇÃO DO OUTRO


CANÇÃO DO OUTRO

minha angustia é só
a capa empoeirada da solidão.

lamento o passado de silêncio
e ansiava pelas mãos dadas.

cavalguei reinos e fui herói
e sem ninguém saber chorei
entre lençóis, mas venci e inimigos
frios caíram aos pés de mim.

hoje amo e tenho
mas medo dói e me calo
tranco minhas portas comportas
portais

penduro minhas tristezas em varais
e ninguém as vê
(só aqueles que forem ursos iguais
a mim):

leões.
mas nem tudo é silêncio
e há os gritos dos raios
de festas e fantasia

enquanto o meu eu
calado e fechado
dança em labaredas
de lembranças

e aguarda o ombro
o telefonema
o dizer a resposta
a dança:

essa burra
burra
burra esperança.


18/07/2012